segunda-feira, 27 de julho de 2009

Dossiê K - corrupção e truculência


Poderia muito bem ser um filme de Velho-Oeste, desses que fala de terras onde não há Lei; mas, infelizmente, a história retratada em "Dossiê K" se passa no Brasil do século XXI, mais especificamente em Goiás - embora reflita o que ocorre em todo o país, inclusive nos grandes centros.

A temática? A quase impossibilidade de se fazer um jornalismo independente do Estado; ameaças de morte; e a estreita ligação entre Estado, Grande Imprensa e corrupção, mostrando que a mídia brasileira nutre-se e cala-se à custa do erário.

A diferença? Uma rádio - uma! - que não aceita os rios de dinheiro público que as autoridades querem despejar nos cofres da emissora em troca da liberdade de imprensa.

"Dossiê K", livro escrito pelo jornalista Jorge Kajuru, retrata as perseguições sofridas pelo profissional de imprensa, que, ao não vender o seu silêncio para a corrupção, passou a ser perseguido pelo então governador de Goiás Marconi Perillo - hoje, vice-presidente do Senado brasileiro (um alô para quem acha que o FORA SARNEY vai resolver o problema).

É mostrada uma face ditatorial do governo Fernando Henrique Cardoso - que permitia que suas agências fechassem, diversas vezes, a Rádio K, emissora de Kajuru que, por todos os lados, Marconi Perillo tentou calar.

Complementando o que Luís Nassif defende em "O caso Veja", "Dossiê K" mostra como a Grande Mídia brasileira, quando critica, tem por objetivo atrair o alvo das críticas para sua lista de anunciantes. Nassif mostra isto com relação a Daniel Dantas e Veja; Kajuru faz o mesmo em relação a Marconi Perillo e as revistas IstoÉ e Veja.

Conforme este livro (que fora proibido pela Justiça de Goiás), o nepotismo e o loteamento de cargos, a intimidação de familiares de jornalistas, a corrupção desenfreada nas diversas secretarias de estado, o Caixa 2 com dinheiro público e a incapacidade de governar com uma - repito, uma! - emissora de rádio independente, fazem do psdbista Marconi Perillo um verdadeiro coronel.

Enquanto todas as outras emissoras nadavam na estabilidade do dinheiro público garantido ao final do mês, a rádio de Kajuru, que não era uma empresa mas um ideal... esta rádio, que vivia sendo fechada pelos tucanos Perillo e FHC, conseguiu sobreviver ao custo de enormes dívidas, perda de quase todos os anunciantes - mas principalmente - a perda do casamento, da saúde e da vida particular de um jornalista que o dinheiro e o poder não conseguiram comprar.

Como afirma Fábio Del Ducca: "A trajetória narrada compreende o período entre janeiro de 1998 e setembro de 2002. Todas as denúncias transcritas no livro são apresentadas juntamente com documentos; uma tentativa de demonstrar a veracidade dos fatos revelados pelas reportagens. A linha editorial é sustentada por quatro preocupações:
1 defender a midia livre;
2 recusar dinheiro público, aceitando anúncios apenas da iniciativa privada;
3 estabelecer relação de cumplicidade com o ouvinte;
4 implantar o jornalismo investigativo no Estado.




O livro Dossiê K você baixa clicando aqui; São 270 páginas, porém com muitas fotos e letra grande, dá pra ler rapidão.

ps: O jornalista sofreu 116 processos por suas reportagens-denúncia - não perdeu nenhuma causa. Em entrevista a João Gordo, Kajuru afirma que, no total, a Rádio K fora fechada 11 vezes pelo governo FHC. Liberdade de Imprensa? Liberdade de Empresa!

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Olha o BARRACO no blog da Soninha e ela com todo silêncio...

Humberto disse...

Soninha,
Tem gente que fica criando caso, procurando provocá-la, diminuí-la, pelo fato de você ter se aproximado do Serra. Pois é. Pode não ser a melhor coisa do mundo porém ainda acho menos inglório do que outras correntes políticas de passado tão moralista, tão purista, e um presente tão emporcalhadamente vergonhoso.
O PT que tantos e tanto criticou, hoje tem como aliados Sarney, Maluf, Delfin Neto, Quercia, ACM(enquanto era vivo),entre outros. O partido das virgens quando assumiu o poder, montou um prostíbulo. Fizeram toda oposição possivel, moral e imoral sobre FHC, Covas e Serra, por que são liberais, mas nem se o Serra tivesse sido eleito seguiria tão fielmente a politica econômica de FHC como Lula. Todos esses citados acima, aliados ao governo têm uma extensa folha corrida de defesa do interesse dos trabalhadores e do país, não é mesmo?
Não vejo mal nenhum em você e seu partido se aliarem ao PSDB, como acho que seria melhor para o país se o PT tivesse se aliado ao PSDB do que ao crime organizado e partidarizado.
Sou filiado ao PT desde 86 e acho que hoje é um partido que representa tudo o que há de podre, vil, mesquinho, interesseiro e pior para o país. A mecânica política fisiológica e demagoga é desmobilizadora devendo deixar como legado uma geração que vê o poder e a política como sinônimo de vilania, mau-caratismo, roubalheira, etc ( quem abre os jornais, tem como ver de outro jeito).
Continue seguindo sua cabeça e deixe pra lá as críticas ressentidas. Em sua atual agremiação você tem mais autonomia para tomar decisões. Melhor do que no tempo do PT em que tinha que ser contra esse ou aquele, empunhar a crítica recalcada sobre os que eram de partidos que destoavam destes “socialistas”.
Parece que a esquerda se dividiu em dois grandes blocos, fora os independentes que não se comprometem com nenhum desses grupos: os “bichos do mato”, ranzinzas, reclamões, que se deixar, transformam isso aqui numa Cuba ou numa Coréia do Norte, ou os “Al Capones”, que fazem todo tipo de negociata com gente de toda estirpe. São verdadeiros bandidos envolvidos com tudo o que não presta. Se isso aqui fosse um país, muito lider esquerdista iria dar uma de Gramsci, iria teorizar da cadeia.
Sucesso e um abraço.


Marcelo disse...

Humberto, além de puxa-saco, você também é sem caráter igual a subprefeitinha carguista e neotucana. Escreve ai para quem o Quércia está fazendo campanha para presidente e com quem ele se aliou? é com o PT e com Lula? ACM junto com o PT? kkkkkkkkkkkk, para quem mesmo ACM fez campanha para presidente da república? vou te dar uma dica: enquanto o estado de S.P. era refém do crime organizado, sofria ataques do PCC, PCC esse nascido, criado e desenvolvido sob as vistas grossas da política de segurança pública do PSDB, o candidato tucano a presdiente, Geraldo AlckminTIROSO estava de braços dados com ACM, fazendo campanha no interior da Bahia. Não gostar do PT é uma coisa, inventar mentiras é outra bem diferente. Você filiado ao PT e defende a roubalheira tucana? defende Alstom, CDHU, metrô, o sucateamento da escola pública, das cartilhas que pregam a violência, do espancamento de professores e alunos na USP, da invasão da PM na USP, dos piores salários do Brasil pagos a professores e policiais, e assim por diante....é isso que vc defende? faz-me rir. Adianta atacar o PT e pregar o voto em outra gang, que vendeu o país e sucateou os serviços públicos? defender o DEM, partido de ACM, em cujo governo a subprefeitinha trabalha? por que vc não ataca a corrupção, por exemplo, que desviou cerca de 200 milhões de reais da merenda escolar no município de S.P.? e outra, então quer dizer que o PT por que no passado pregava a ética, somente ele pode ser cobrado pelas suas incoerências? PSDB, DEM e outros lixos da política nacional não podem ser cobrados? vai fundo meu filho, seu discurso é de uma coerência espantosa...entregue esse país novamente nas mãos do PSDB e do DEM e você verá o que vai acontecer...afinal, segundo o seu modo de pensar, esses partidos tem gente muito honesta, não é mesmo? Heráclito Fortes, Arthur Virgílio e cia que o digam...e por favor, já que a subprefeitinha se recusa a comentar qualquer coisa sobre a roubalheira e corrupção do PSDB/DEM por aqui, por que você não comenta sobre esse vídeo abaixo, o "modus operandi" de agir do candidato de vocês, aquele que a subprefeitinha chama de "esquerdista que tem horror a política neolibeal"...

http://www.youtube.com/watch?v=Bp6otqXPQIQ

mas engraçado...para pagar os precatórios, a gang Serra/kassab não tem dinheiro. Mas um tem dinheiro para torrar 313 MILHÕES DE REAIS EM PUBLICIDADE e o outro, tem grana para pagar a "assessora do Movimento Cansei", a qual mantem relações íntimas com membros dos governos Serra/kassab. Quanta coincidência, não acha?

http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/kassab-paga-mais-de-r-1-milhao-para-assessora-do-cansei/

é isso que você prega na política? novamente, faz-me rir...quanta incoerência!!!

opss...Humberto ia me esquecendo: responde também para a gente de onde se originaram (politicamente) Kassab, Afif e muitos outros que hoje estão nos governos estaduais e municipais de S.P., que você tanto defende....Kassab não era secretário de Pitta, governo no qual aumentou seu patrimônio em mais de 300%?

o "petista" Humberto talvez também queira nos explicar o vídeo abaixo, do senador Marcos Perillo, vice-presidente do senado e que pode vir a administrar a casa, caso Sarney se afaste ou renuncie. Por que será que dele ninguém escreve nada? Sarney é um bandido sem dúvida, mas é com esse tipo de gente que o Humberto defende se coligar? e oque dizer do Sarney, quando foi presidente do Senado em 1995 e TAMBÉM LÍDER DO GOVERNO FHC no mesmo senado? então quer dizer q naquela época ele não era bandido,somente virou agora depois que se aliou com o PT, não é mesmo Humberto? e o que dizer de Renan Calheiros, bandido desde a época de Collor e que foi MINISTRO DA JUSTIÇA DE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO? então na época em que ele era ministro de FHC ele era honesto, não é mesmo Humberto? e crime organizado talvez você fale por saber muito bem, não é mesmo (já que prega a união do PT com o PSDB): é o PCC tomar conta do estado e do sistema penitenciário paulista e o partido que está há 16 anos no poder nada fazer, é um ex-presidente dizer que acha Daniel Dantas uma pessoa "brilhante", é um partido (PSDB) inventar o "mensalão" em MG, nas eleições de 1998, mas a imprensa fingir que isso nunca aconteceu...aliás, será que o "petista" Humberto poderia nos dizer por que o honesto Serra e seu partido exemplar, o PSDB, assinaram manifesto de apoio ao governo Yeda Crusius, atolado até o pescoço em corrupção??
.
e esse é o tipo do político que Humberto, o "petista" defende para assumir o senado. Fora Sarney, mas fica gângster Perillo, não é Humberto? http://www.paulohenriqueamorim.com.br/?p=13843

sexta-feira, 10 de julho de 2009

O discurso (inesquecível) de Serra ao receber o “Prêmio Mico”


DEPOIS DE LER VOTAR A ENQUETE AO LADO

O Conversa Afiada reproduz e-mail que recebeu da amiga navegante Maria Edith:

Maria Edith
Enviado em 10/07/2009 às 10:17

Prezado Paulo Henrique, comentaristas, leitores(as) e inimigos (as),
Salve, salve a todos.

Encaminho o texto que está no Blog do Azenha – clique aqui para ler - , aqui está o discurso do Serra proclamado ao receber o prêmio. Agora no tenho mais dúvidas, estão lelé da cuca. Surtaram mesmo, topam tudo para continuar no poder e no $ .
Já tinha avisado para no subestimar os inimigos.
Que TODOS (AS) OS DEUSES (AS) nos protejam, que a população acorde e as autoridades também. Da um profundo medo essa gente.
Aviso, realmente sou eu mesma que escrevo. Já que agora a moda é falsificar e devidamente publicado en jornais que se acham “respeitáveis”. Realmente o surto é coletivo.

Cordialmente, María Edith

Serra e o prêmio-mico:’este representa uma das maiores satisfações de minha vida pública’

Atualizado em 10 de julho de 2009 às 00:26 | Publicado em 09 de julho de 2009 às 21:29

O prêmio-emergência, para aplacar a dor-de-cotovelo do governador em relação ao presidente Lula, virou prêmio-mico do ano.
Primeiro, se descobriu que o currículo da dona da ONG responsável pela indicação de José Serra está mais para folha corrida.
Depois, que a solenidade não foi no plenário do Conselho Geral da ONU, como próprio Serra alardeou pelo twiter. Foi numa sala emprestada.
Em seguida, a própria ONU tratou de esclarecer que não tem qualquer relação com a dita ONG.
Para acabar o dia, o discurso de agradecimento pelo prêmio, no portal do Governo do Estado de São Paulo . A dica é do leitor Vangelis
Como o discurso pelo prêmio-mico provavelmente vai “evaporar-se”, copiamos na íntegra. Interessante notar que o objetivo era dar um upgrade no currículo de saúde de Serra, que nos últimos dois meses sofreu dois baques sérios. O programa Nacional de DST/Aids, que ele dizia ser o criador, o Viomundo provou que não é. Também perdeu a “paternidade” dos genéricos. O teste de DNA demonstrou que o pai é o médico Jamil Haddad.
Agora, este mico. Confiram o discurso. Vangelis antecipa: “Impossível não rir”.
Serra agradece homenagem na sede da ONU, em Genebra

Genebra, 8 de julho de 2009

“Este prêmio da Organização Mundial da Família (OMF) representa uma das maiores satisfações que já obtive ao longo de toda minha vida pública. Não sou médico, mas economista e professor universitário. Antes de assumir o Ministério da Saúde no Brasil, em 1998, eu havia sido secretário estadual e ministro do Planejamento e Orçamento, e membro do Congresso Nacional, mais afeito aos assuntos da economia e da política. Por isso, refleti muito antes de aceitar o convite do então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, para licenciar-me do Senado e comandar uma área tão complexa quando a da Saúde no meu país.
Aceitei e permaneci no ministério até 2002. Não me arrependi. Em geral, dentro do Brasil, o reconhecimento do nosso trabalho – digo nosso porque incluo toda a equipe que me acompanhou – foi muito positivo. Mas receber agora uma homenagem neste plenário das Nações Unidas, de uma instituição da qualidade e da representatividade da Organização Mundial da Família, complementa aquele reconhecimento de forma muito especial.
Quando assumimos o Ministério da Saúde definimos, entre outros objetivos, a necessidade de:
1. Concluir a implantação do Sistema Único de Saúde, criado pela Constituição de 1988, que pressupõe o acesso universal e gratuito aos serviços de Saúde, dentro de uma só rede, que integra governo federal, estados e municípios.
2. Fortalecer o setor de prevenção e atenção primária; ampliar o acesso da população mais carente às melhores técnicas e procedimentos da medicina mais avançada, no que se refere a medicamentos, cirurgias, tratamentos e medicamentos; estimular ainda mais o desenvolvimento desse setor da medicina mais avançada, que no Brasil é bastante significativo.
3. Ampliar e estabilizar o financiamento à Saúde pública; paralelamente, aumentar a eficiência e a economicidade dos gastos, ou seja, melhor aproveitamento dos recursos disponíveis e redução de custos de insumos.
A questão do financiamento do setor da Saúde ocupou um papel central na nossa gestão, uma vez que o Ministério da Saúde e as secretarias estaduais e municipais de Saúde dispunham das maiores fatias dos orçamentos governamentais suscetíveis de sofrerem cortes diante de conjunturas adversas, virando um verdadeiro colchão amortecedor das crises fiscais. Por isso, nos dedicamos à aprovação, difícil, mas bem sucedida, de emenda constitucional que garantiu uma vinculação de recursos à Saúde: no caso dos municípios, 15 por cento de suas receitas próprias mais transferências líquidas; no caso dos Estados, 12 por cento; no caso do Governo Federal, a norma de que o orçamento de cada ano deve incorporar o crescimento do PIB nominal do ano anterior. A emenda previu, ainda, a necessidade de uma lei, a ser aprovada até 2004, que levasse em conta os resultados das vinculações e enfrentasse os eventuais problemas de financiamento que remanescessem. Infelizmente, isso ainda não aconteceu.
Em relação à prioridade da prevenção e na atenção primária de Saúde, nosso instrumento fundamental foi o Programa de Saúde da Família, formado por equipes compostas por um médico, uma enfermeira, duas auxiliares de enfermagem e cinco agentes comunitários de saúde, assim como um dentista para cada duas equipes. Além disso, cada equipe pode atender até mil famílias cadastradas, numa região determinada.
Esse programa, organizado e subvencionado pelo Ministério da Saúde, em parceria principalmente com os municípios, já existia no Brasil, mas de forma restrita e localizada. Em quatro anos multiplicamos as equipes em cerca de dez vezes (chegando a contratar 160 mil profissionais de saúde), atendendo cerca de um quarto da população brasileira, precisamente aquela que sofre de maiores carências. Multiplicamos também, por três, o número de agentes comunitários de Saúde, de 50 mil para cerca de 150 mil, concentrados nas áreas mais pobres, e dois terços deles atuando fora das equipes do PSF.
Em algumas regiões do país, como o Nordeste, o PSF já cobria, em 2002, 40 por cento, e os Agentes Comunitários, 80 por cento da população. Na realidade, trata-se de programa de baixo custo: nas regiões menos desenvolvidas do país, a equipe custa menos de 3.000 dólares por mês (PPP, em dólares de 2000).
O impacto imediato do programa nas condições de saúde da população é significativo, favorecendo a prevenção, reduzindo a pressão sobre os hospitais, informando pessoas sobre o que fazer e como agir quando ocorrem problemas de saúde. O PSF atenua uma dificuldade descrita de forma aguda e precisa na memorável incursão sociológica de um ex-ministro da Saúde (Dr. Adib Jatene): o problema dos pobres não é sua condição de pobreza, mas o fato de conhecerem somente pobres.
Ainda em relação à prevenção, aumentamos muito os investimentos a fundo perdido no saneamento básico dos 2.300 municípios mais pobres, medidos pelo seu Índice de Desenvolvimento Humano. Ampliamos as ações de melhor nutrição (com a criação do programa da Bolsa Alimentação, voltado às mulheres grávidas e as crianças pré-escola, das famílias mais pobres, posteriormente incorporada ao Bolsa Família), de imunizações e de combate às endemias.
Na área da Saúde da Mulher, aumentamos de um para cinco o número médio de consultas pré-natais no sistema público, diminuímos os partos cirúrgicos desnecessários, aumentamos em 2,5 vezes a remuneração pelos partos, implantamos sistemas estaduais de atendimento às gestantes de alto risco e as UTIs neo-natais. Ao mesmo tempo, fizemos vasta campanha de prevenção do câncer do colo do útero, vacinação contra a rubéola e introdução da anestesia nos partos dentro do sistema público de Saúde.
Um dos resultados dessas ações foi o acentuado declínio da mortalidade infantil entre 1997 e 2002: de 31,9 para 24,3 óbitos de crianças menores de 1 ano para cada mil nascidos vivos. Isto significou que quase uma morte em quatro passou a ser evitada. Outro resultado foi o declínio da mortalidade materna nos hospitais do SUS (número de óbitos a cada 100 mil internações obstétricas, de 37 para 26 entre 1995 e 2001).
A ênfase na medicina preventiva se expressou na introdução de novas vacinas e na ampliação das coberturas: o número de doses aplicadas aumentou em 50 por cento entre meados dos anos noventa e o início desta década (214 milhões para 322 milhões). De fato, fizemos com que o Programa Nacional de Imunizações atingisse os níveis recomendados pela Organização Mundial da Saúde, beneficiando principalmente as crianças e as pessoas de mais idade.
O tétano neo-natal foi eliminado em quase 100 por cento dos municípios; mantiveram-se erradicadas a poliomelite e a varíola; a coqueluche, a difteria e o cólera caíram a níveis insignificantes; o sarampo foi virtualmente eliminado a partir de 1998.
Outra ação que empreendemos, de diferente natureza das anteriores, mas essencial à prevenção de doenças e à qualidade de vida, foi o combate ao tabagismo, começando pela proibição de todo tipo de publicidade de cigarros, controles e normas mais rígidas de fabricação e advertências nos maços, contendo fotos de pessoas doentes em razão do fumo. Tais medidas, adotadas há cerca de dez anos, contiveram o avanço do tabagismo no Brasil e estão sendo complementadas neste ano, no Estado de São Paulo, onde sou governador, com a proibição total do fumo em lugares fechados.
Também ampliamos consideravelmente o acesso da população à medicina de ponta, como medicamentos de alta complexidade (hepatites, por exemplo), cirurgias e tratamentos de doenças cardíacas, câncer, e, inclusive, às cirurgias de transplantes de órgãos, as mais complexas de todas. Nesta área, o Brasil passou a ser o segundo país do mundo, depois dos Estados Unidos, em número de cirurgias, financiadas pelo SUS. Entre 1997 e 2002, o volume de transplantes cresceu de 80 a 260 por cento, segundo diferentes tipos de órgãos.
Seguindo o princípio de que o acesso a medicamentos é um componente essencial do direito à saúde, instituímos por lei a introdução dos medicamentos genéricos no Brasil, ampliamos a distribuição gratuita da cesta básica de medicamentos na rede do SUS, bem como o fornecimento gratuito dos medicamentos de maior complexidade. Eliminamos os tributos federais sobre medicamentos de uso permanente e antibióticos, e criamos uma agência reguladora no estilo do FDA.
Coube-nos também enfrentar a infecção pelo HIV, a AIDS, realizando a que foi considerada a melhor campanha do mundo em desenvolvimento. Essa campanha, que prossegue até hoje, enfatizou não apenas a prevenção como também o tratamento, gratuito e universal, estabelecido em lei pelo governo de F. H. Cardoso e cuja implantação deu-se principalmente na nossa gestão. Assim, o Brasil foi o primeiro país em desenvolvimento a comprometer-se com essa medida.
A campanha é comandada pelo governo federal, com intensa participação dos Estados e Municípios e de algumas centenas de organizações não-governamentais, aliás, peça-chave do sucesso do programa. De fato, a campanha brasileira anti-AIDS contrariou uma previsão pessimista e uma recomendação, ambos do Banco Mundial no começo dos anos noventa, de que a doença se expandiria explosivamente e que a ação dos governos dos países em desenvolvimento deveria se concentrar na prevenção. Mas o tratamento salva e melhora a qualidade de vida, freia a transmissão, protege os bebês de mães portadoras do vírus.
Os elevados gastos da campanha anti-AIDS levaram-nos a um conflito internacional em torno dos direitos de propriedade intelectual. A fim de reduzir custos, recorremos à produção local e/ou importação (principalmente da Índia) de matérias primas para medicamentos genéricos, bem como na utilização da possibilidade da quebra de patentes para forçar as indústrias farmacêuticas a baixarem seus preços.
Em busca da cobertura para nossa política nessa área e na defesa da saúde nos países em desenvolvimento, terminamos levando a questão das patentes de medicamentos à Organização Mundial do Comércio, e , na reunião de Doha, conseguimos a aprovação de um dispositivo nas TRIPS (acordo que lida com a relação entre comércio e propriedade intelectual) que reconhece a legitimidade de licenciamento compulsório de medicamentos essenciais cujos custos exijam gastos públicos que vão além das possibilidades econômicas dos países em desenvolvimento.
Como escreveu um grupo de pesquisadores na Global Public Health:
“Brazil’s efforts to preserve its domestic AIDS treatments had far reaching implications for global essential medicines policy. (…) Improved global transparency about drug prices, affirmed generic drug use to address public health needs, defined access to medicine as a component of the human right to health, promoted incorporation of ARVs into the WHO Essential medicines List and strengthened TRIPS flexibilities for developing countries.(…). Brazil’s efforts have helped shape and promote a global agenda to meet the health needs of developing countries, and these discussions continue to impact global essential medicines policy today. These are the important and enduring legacies of Brazil’s world-renewed AIDS treatment programme.”
Creio que esse reconhecimento constitui a melhor recompensa para aqueles que se dedicam a formular e implantar políticas públicas, no caso, da Saúde: constatar que essas políticas deram certo, que têm efeitos duradouros e servem de exemplo a outras regiões do mundo.

Em tempo: o Zé Pedágio, note amigo navegante, não diz mais que inventou o programa da AiDs, mas, que, sem ele e o FHC o programa não teria ido em frente … Ele não fala mais que inventou os genéricos… Mas continua a dizer que é economista. Cadê o diploma de uma faculdade BRASILEIRA ? Cadê ? – PHA

Em tempo 2: recebemos do amigo navegante Rivaldo, de Salvador:

Rivaldo – Salvador
Enviado em 09/07/2009 às 23:52

ESCLARECIMENTO DA ONU SOBRE A ONG QUE HOMENAGEOU O SERRA

Por Valeria Schilling

ESCLARECIMENTO

A World Family Organization (WFO) não é uma entidade da Organização das Nações Unidas (ONU). Trata-se de uma Organização Não-Governamental (ONG), com sede em Paris, associada ao Conselho Econômico e Social (ECOSOC) da ONU, com status consultivo, e associada ao Departamento de Informação Pública (DPI) da Organização.

As ONGs associadas ao ECOSOC e afiliadas ao DPI não representam a ONU nem podem, em qualquer hipótese, falar em nome da Organização. Seu papel é de colaborar com as Nações Unidas, de forma voluntária, ajudando na divulgação das atividades da Organização e, no caso do ECOSOC, contribuindo com sugestões às atividades do Conselho.

Valéria Schilling
Assessora de Comunicação
Centro de Informação das Nações Unidas para o Brasil (UNIC Rio)

QUEREMOS CONSTRUIR UMA UNE ParaTodos

Manifesto ao 51º Conune



Apresentamos este manifesto em contribuição ao debate nesta reta final rumo ao 51º Conune. Somos estudantes de diversos cantos do país comprometidos com um projeto de desenvolvimento nacional a serviço do povo e para o povo brasileiro. Que defendemos um projeto democrático e popular e lançamos neste congresso o nosso movimento: ParaTodos, inspirados no baião do Chico, que cantou as diferenças, saudando-as e exaltando-as. No Movimento Estudantil, estamos presentes em 21 estados da federação, do sudeste ao nordeste, passando pelo centro-oeste, e de norte a sul.




Brasil ParaTodos os brasileiros



O governo Lula caminha no rumo do país que queremos, pois pratica uma política econômica que privilegia o crescimento comprometido com a distribuição de renda e da riqueza, com a recuperação do poder do Estado e da qualidade do serviço público e com um comportamento afirmativo do Brasil perante o mundo. É um governo que está mudando o Brasil. Está rompendo as tradições elitistas, clientelistas e patrimonialistas que historicamente fizeram com que direitos fossem considerados favores, que privatizaram o Estado e concentraram a riqueza e o conhecimento nas mãos de poucos.



A nação brasileira, como um dos focos de resistência ao imperialismo norte americano, desempenha papel estratégico no avanço do movimento de contestação e esgotamento do capitalismo. O governo Lula fortalece as relações comerciais com bloco do Mercosul e com os países da Ásia e África, principalmente no que se refere à nova matriz energética mundial, na exportação de minério de ferro e alimentos, de maneira a desempenhar papel de protagonista nas relações internacionais, como nunca tinha ocorrido com a nação brasileira. Isso reafirma a autonomia e soberania brasileira e consolida sua tarefa de pensar a nova civilização, com respeito aos povos e autodeterminação das nações.



E isto está sendo um fator fundamental que nos favorece no combate a crise internacional colocada. Pela primeira vez, estamos em um país que não precisa de pacotes emergenciais, que não tem sua moeda desvalorizada, perda de riquezas, quebra de empresas, demissões em massa em decorrência de uma crise mundial. Mesmo sendo essa uma crise estrutural do sistema capitalista.



Sabemos que em 2010 estarão em evidências dois projetos distintos: o do campo progressista, representado pelo governo Lula, e a volta do modelo neoliberalista dos Demo-tucanos. Estamos do lado do povo, estamos do lado de Lula. Acreditamos que é fundamental rearticular o campo democrático e popular, aprofundar o diálogo com os demais movimentos sociais, no sentido de fortalecer, pautar, defender e, principalmente, disputar cotidianamente, os rumos do atual governo e aprofundar essas transformações em uma plataforma eleitoral para 2010.





O movimento estudantil na construção de um novo Brasil



Acreditamos que três debates serão centrais neste 51º Conune. O primeiro é o debate da conjuntura nacional, a disputa de 2010 e a continuidade do projeto de nação em curso. Para a defesa deste projeto, acreditamos que seja fundamental unificar as forças que compõem o campo democrático-popular, para apresentar uma plataforma socialmente referenciada para o povo brasileiro, em que conste o projeto de país dos estudantes brasileiros.



O segundo debate fundamental será o debate educacional, em que devemos fazer a defesa da gestão progressista do MEC, que construiu Prouni, o Reuni, o PDE, a expansão das universidades federais, instituiu o piso nacional dos professores e colocou a educação no centro do debate, convocando a I Conferência Nacional de Educação. Temos a tarefa de apontar novos desafios para o 3º mandato democrático-popular e aprofundar ainda mais as transformações estruturantes no modelo educacional brasileiros, inclusive adotando 10% do PIB em investimentos com a educação, acabando com a DRU e extinguindo os vetos de FHC ao PNE.



O debate do movimento estudantil em si, como terceiro item, deve ser central, especialmente no intenso momento de refluxo que o ME passa. É preciso discutir seriamente e com muita tranqüilidade e responsabilidade o funcionamento da UNE e demais entidades estudantis. As entidades precisam democratizar cada vez mais seus espaços internos e garantir uma maior participação do conjunto dos estudantes nos espaços decisórios das entidades. Explorar democraticamente o contraditório e permitir que as divergências possam fraternalmente emergir.



Hoje a UNE não consegue responder de forma rápida aos anseios e desafios que se apresentam, sendo, por isso, necessária uma ousada transformação nos métodos de participação dos estudantes. É preciso incluir o máximo possível de estudantes decidindo os rumos da entidade. Contudo, esse objetivo nunca será alcançado se reproduzirmos as velhas práticas que tanto questionamos. Por isso, temos que nos basear no princípio da radicalização democrática. Não se trata de satanizar nenhuma força política. Queremos sim fortalecer o movimento e marchar ao lado daqueles setores que estejam dispostos a transformar o movimento estudantil brasileiro.



Por fim, não elegemos nenhuma força do Campo Democrático Popular como adversária pois sabemos de que lado estão os nossos verdadeiros adversários. Esgotaremos o debate interno sobre a melhor tática a ser adotada no Conune, mantendo o paradigma construído a partir de nossa plenária nacional, realizada no dia 23 de março em São Paulo, de não construir acordo algum da CNB nos estados com qualquer que seja a força política que passe pelo Congresso da UNE. Esta opção, que liberou os estados para construírem suas próprias políticas de alianças, se mostrou muito acertada: chegamos a mais universidades e dialogamos com mais estudantes e, consequentemente, fortalecemos a nossa bancada.



Nosso coletivo encerra esses três meses de campanha para chegar e intervir neste 51º Congresso da União Nacional dos Estudantes forte e unido, seja como for.



Queremos dialogar com o conjunto dos estudantes brasileiros e fazer com que nossos ouvidos ouçam o máximo de opiniões e propostas, sem medo de fazer os intensos debates que precisam ser feitos para fazer avançar ainda mais a democracia de direitos que vem sendo conquistada pelo povo nos últimos sete anos.



Queremos construir! Queremos uma UNE ParaTodos!





CONSTRUINDO UM NOVO BRASIL – ParaTodos



SP Debora Pereira – Jornalismo UNISA / Diretora de Universidades Pagas UNE

SC Edenilson Petter – Vice-Santa Catarina da UNE

RS Guilherme Ortiz – Ciências Sociais ULBRA / 1º Diretor de Cultura da UNE

PA Cássio Nogueira – Ciências Sociais UNAMA / 1º Diretor de PPJ da UNE

AC Dimas Sandas – Jornalismo UNINORTE

AM Anne Karolyne – Enfermagem UEA

AP Rosinete Duarte – Secretariado Executivo UNIFAP

BA Fernando Pacheco – Economia UFBA

CE Edson Ferreira – Ciências Sociais URCA

DF Luiz Eduardo Braga – Jornalismo IESB

MG Edgar Silva – Filosofia UFMG

MS Charles Mueller - DCE Facsul

MT Tiago Oliveira – Letras UNEMAT

PA Liana Azevedo – Ciências Sociais UFPA / Diretora da PPJ UAP

PE Movimento Acionando Flores

PE Magno Augusto – Tesoureiro da UEP

RO Géssica Bergamini – Psicologia ULBRA

RR Elzilene Libório – Secretariado Executivo UFRR

RS Murilo Amatneeks – Geografia UFRGS

SE Jefferson Lima – História UFS

SE José da Conceição – estudante da UNIT

SP Juliana Borges – Letras USP / Diretora de Movimentos Sociais da UEE-SP
RJ Movimento Ousadia - Estacio de Sá - Simonsem - UniCarioca

quinta-feira, 9 de julho de 2009

OPORTUNISMO DE HIPÓCRITAS

*Carlos Nina
Em dois recentes episódios do Senado, um presidente da instituição renunciou após acusação de recebimento de propina de pequeno valor nesse tipo de transação, já incorporada à cultura e indissociável da história e das tradições de praticamente todas as atividades lícitas e ilícitas deste País. Outro, por força desses valores, também renunciou porque aceitou ajuda do empresariado - sempre solícito e solidário com autoridades em dificuldades ou nem tanto - para pagar obrigação pessoal de alimentos.Renunciaram porque que quiseram. Poderiam ter ficado e enfrentado o julgamento das acusações que lhes eram feitas. Por razões íntimas, decidiram pela renúncia. Ninguém os obrigou a assinar a renúncia. Poderiam ter exigido o direito constitucional ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa, requisitos fundamentais para um julgamento justo a que todos têm direito. Logo, por maior que tenha sido a pressão que receberam, não poderão, jamais, atribuir a ninguém a decisão final pela renúncia. É ato exclusivamente pessoal.Exatamente por isso é mais um absurdo dos julgamentos sumários que a mídia brasileira faz condenar e até insultar o presidente José Sarney por não querer renunciar ao cargo para o qual foi eleito.Não estou, com isso, dizendo que Sarney é inocente ou que é culpado. Afirmo, apenas, que a decisão de renunciar ou não à presidência do Senado é totalmente pessoal e deve ser respeitada. Se há acusações contra ele e as quer enfrentar, deve ser respeitado por isso, e não insultado. A ofensa pessoal, que extrapola a crítica à conduta pública, é recurso de quem não tem argumento.As acusações contra Sarney seriam absurdas se não fizessem parte, também, da história, das tradições, dos hábitos, da rotina de parlamentares de todos os legislativos do País, municipais, estaduais e federais, de governos federais, estaduais e municipais, de tribunais de todas as instâncias.No caso das nomeações de parentes, a pena seria só para o cargo de Presidente do Senado? Se não, quantos senadores teriam que renunciar? Quantos deputados federais, estaduais e vereadores? Quantos presidentes de tribunais, ministros e desembargadores? Quantos ministros e secretários de Estado? Quantas outras autoridades que assim procedem?Então, se realmente isso é uma irregularidade, que se apure na forma que os constituintes de 88 proclamaram: através do devido processo legal, já que o presidente Sarney não quer – e é direito seu – renunciar.Outra acusação é de tráfico de influência para beneficiar negócio de parente. E de que brotam inúmeras decisões do Executivo e o Judiciário? Quantas vezes, até para dar efetividade a uma decisão justa, o jurisdicionado não precisa ter um canal de comunicação com o julgador?Isso sem falar nos casos em que esse tráfico é apenas uma atividade que nem chega à autoridade. É apenas um meio de vida de atravessadores de falsas facilidades. Com isso não estou afirmando que, também nesse caso, Sarney seja culpado ou inocente. Deve, como qualquer outro, ser apurado, se realmente houver indício para isso. Ou será correto presumir que o presidente do Senado não tem direito às garantias constitucionais, inclusive do direito à imagem e à honra pessoal?
No caso da omissão patrimonial, valem as mesmas perguntas feitas sobre as nomeações. Ou omissões desse tipo só não podem ocorrer com o presidente do Senado?Contudo, as pressões da oposição fazem parte do exercício democrático. Assim como a manifestação da mídia – contra ou a favor - e as reações defensivas de Sarney. É fato público e notório que José Sarney incomoda porque tem sido um eficiente e eficaz aliado de Lula, como nenhum outro, desde as eleições deste em seu primeiro mandato. E é um aliado temido pela inteligência política que tem e pela capacidade de superação e resistência, do que tem sido prova essa crise que está atravessando.O que me leva a essas considerações não é a intenção de defender, como também não é a de acusar José Sarney, mas a indignação com o oportunismo de hipócritas, o dedo em riste de quem não tem autoridade moral para acusar ninguém.O Presidente do Senado tem sido criticado por quem já se serviu desses mesmos favores que agora apontam como aberração: empregos, passagens aéreas, contratos etc.Nessa farsa, sobressai-se, para mim, a OAB, cujos dirigentes fazem discursos de arautos da moralidade, em contradição com o autoritarismo, a imoralidade e a corrupção que grassa nos seus bastidores. Engrossam o coro dos oportunistas, como se a Ordem tivesse direitos que outros não podem ter. São os mesmos que estavam no Conselho Federal da OAB, em Brasília, quando esta inaugurou o seu museu, em 2003. E não sou eu quem diz. Está no site da instituição – se não tirarem depois desta crítica -, onde se lê, com direito a fotografias do evento: “o então Presidente do Senado, José Sarney, teve destacado papel no processo de sua criação, ao gentilmente designar a funcionária responsável pelo Museu do Senado Federal, Sra. Tânia Toledo Tenório, para dar suporte técnico ao projeto instalado na OAB.”
( http://www.oab.org.br/museuOAB/criacao.asp). Será que a OAB não tinha condições de pagar um museólogo? O que torna a OAB imune aos princípios da administração pública?Sarney, realmente, está enfrentando uma crise pessoal, pela sua força política, movida menos pela moralidade e mais pelos interesses contrariados, ou por puro oportunismo de hipócritas. A crise que Sarney enfrenta resulta da que realmente é do Senado. Mais que do Senado, é do sistema político, da sociedade brasileira, de valores morais.Sua renúncia não vai resolver a crise do Senado. Se resolvesse, o Senado não teria mais problemas. Com sua firmeza, Sarney está sendo o bode expiatório de todas as mazelas, assumindo, pelo silêncio, vícios de outros pares. O problema do Senado não é José Sarney. São as práticas dos senadores, suas ações e omissões. E estas são reflexos da sociedade. Afinal, na democracia representativa, todo poder emana do povo e em seu nome é exercido. Sacrificar Sarney não purifica o Senado.A solução da crise dos Parlamentos não está dentro de seus plenários, mas na consciência de cada eleitor no dia da votação.
*Carlos Nina é membro do Instituto dos Advogados Brasileiros e x-Conselheiro Federal da OAB

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Discurso e verdade

O que é a verdade?
Aonde ela se escondeu?
Um dia com desiluções,
Uma vida de imaginações.

Somos quem?
Somos o que pensamos?
Não. Somos a árdua bruta pedra do discurso,
Discurso?

Falação, preposição.
Firmeza, dureza.
Quem nos canta?
Cantar, oh cantar.

Dureza da vida,
Dureza do destino.... Amigos
Amigos são os que ficam,
Ficam e amam.

Defeitos, horrores, máculas
Todos temos,
Mas o que nos torna melhores
É a verdade que perdoa.

Perdão é bem mais que discurso.
Perdão é a mais bela verdade. Pois ela é única.

terça-feira, 7 de julho de 2009

Dilma corrige currículo Serra não corrige o dele


Saiu na Reuters:

Dilma Rousseff admite erro em currículo
terça-feira, 7 de julho de 2009 14:12
RIO (Reuters) – A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, admitiu nesta terça-feira que não concluiu os cursos de mestrado e doutorado em Ciências Econômicas na Unicamp, apesar de a informação constar em seu currículo no site do ministério.
Dilma, pré-candidata à sucessão presidencial, afirmou que concluiu todos os créditos dos dois cursos, porém alegou que não teve tempo hábil para defender as respectivas teses porque as funções públicas que ocupava não lhe permitiram.
Reportagem da revista Piauí questionou o currículo de Dilma divulgado pela Casa Civil.
“Eu fiz doutorado em 1997 e 1998, concluí todos os créditos, eu tinha um prazo para fazer a tese. Enquanto não me jubilarem eu sou doutoranda”, disse Dilma a jornalistas após cerimônia no Rio de Janeiro.
A ministra disse que havia um erro nas informações divulgadas pelo Sistema de Currículo Lattes, que mostrava que ela cursou ciências sociais.
“Aquela ficha do Lattes era de 2000. Eu era secretária de Minas, Energia e Telecomunicações (do Rio Grande do Sul). Eu não tinha mais nenhuma vida acadêmica. Eu era doutoranda porque eu não tinha sido jubilada, era doutoranda”, acrescentou.
“Ao que me parece, eu fui jubilada (da Unicamp) em 2004 mas não fui comunicada”, disse, acrescentando que tem interesse em concluir o doutorado.
Depois do questionamento da imprensa, o site oficial da Casa Civil informa que ela é formada em economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e foi aluna de mestrado e doutorado em Ciências Econômicas pela Unicamp, “onde concluiu os respectivos créditos”.

Há uma diferença importante entre as duas situações.O currículo de Dilma estava anabolizado.

Ela não defedendeu tese, portanto, não era Doutora em Economia.

Ela é economista, mas não é doutora em Economia.

E pode proclamar-se economista.

Tratava-se, porém, de um erro lamentável: informar ao site da Presidência da República o que não era verdade.

Outra coisa, mais grave, é o que acontece com o Zé Pedágio.

Ele se apresenta como economista.

Ele informa à Justiça Eleitoral que é economista.

E não é economista (aliás, não deixe de votar na enquete ao lado).

Ele pode até saber algumas coisas de Economia.

Sobre câmbio, por exemplo, ele sabe sobre câmbio o que todo mundo sabe.

Sobre juros, por exemplo: ele é contra a política do Banco Central.

Ele e a torcida do Flamengo.

Minha mãe, também foi ótima economista.

Com o salário de barnabé de meu pai, educou três filhos (e bem !).

Como se sabe, ninguém precisa de diploma para ser jornalista, economista nem advogado.

Se o Gilmar Dantas (*) fosse corajoso mesmo, dispensava o diploma para exercer a profissão de advogado e de economista.

Só que o Serra não tem o diploma de economista.

Sobre isso, o PiG (*) não diz nada.

Nem o Serra.

E os dois – Serra e o PiG (**) – acham que o Serra é um “economista competente”.

Se não fosse o PiG (**) , esses tucanos de São Paulo, na Dutra, não passavam de Resende …

Paulo Henrique Amorim


PPS lança Soninha ao governo de SP; ex-vereadora descarta voltar ao Legislativo

da Folha Online

A direção do PPS paulista decidiu nesta segunda-feira lançar a candidatura da ex-vereadora e subprefeita da Lapa, Soninha Francine, ao governo do Estado de São Paulo.

"Não tenho vontade de ser parlamentar novamente, foi muito bom, aprendi muita coisa, mas minha vontade é estar no Poder Executivo", disse Soninha à Folha Online ao confirmar sua candidatura.

A ex-vereadora falou ainda sobre sua campanha à prefeitura no ano passado e sua relação com o PPS. "Tive total liberdade [durante a campanha], nunca o partido falou não diga isso ou aquilo. Fui muito feliz, uma campanha atrevida."

Soninha afirmou que recebeu o convite da legenda para sair candidata ao governo há cerca de um mês. Ontem, no entanto, a candidatura foi oficializada pela legenda. Ela disse que o partido ainda não tratou de alianças políticas, e que primeiro está "arrumando a casa".

O PPS marcou para o dia 23 de agosto o ato político que apresentará a candidata do PPS. Antes disso, entre os dias 7 e 9 de agosto, irá realizar seu Congresso Nacional no Rio de Janeiro.

Na ocasião, o partido vai para reafirmar o apoio da legenda à candidatura do governador paulista José Serra (PSDB) à Presidência da República, com a indicação do governador mineiro Aécio Neves (PSDB) para vice.


*** Que papelão Soninha....

Agora tenho a prova de que não passa de um interesseira obssecada. Uma carguista enlouquecida e neotucana desisperada.....

Quando nos conhecemos (depois de sua derrota para a prefeitura) jurava de pés juntos que não concorreria a outro cargo, principalmente o de governadora...

Agora está ai a resposta, imagine só se fosse prefeita... Deixaria o cargo para disputar a presidência da ONU....

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Lutar sempre, Desistir jamais.

A cada dia sou julgado, condenado e caluniado por ter um sonho. Não sou de nenhuma maneira perfeito, não sou repleto de virtudes, não tenho nenhuma prepotência de dizer que posso e sou bem melhor do que outro.
Mas, tenho uma certeza, a de que posso muito mais do que apenas falar, do que apenas criticar do que apenas condenar. Posso e devo agir, posso e deve fazer coisas para transformar minha realidade, e tornar meus sonhos, que são os sonhos de um povo pobre e necessitado.

Para aqueles que me condenam mostro o meu trabalho, e para aqueles que dizem que só penso na política "instituicional" mostro a transformação social da minha comunidade...


Vivendo e aprendo, sempre... Melhorar a vida dos outros é bem melhor do que pensar apenas no meu quadrado, na banda "foda", no mangá muito louco, ou ficar o tempo todo dizendo que os outros são toscos e alienados mas não fazer nada para mudar.

É esse o meu desabafo

domingo, 5 de julho de 2009

Uma aula de Democracia


Entrevista com Fábio Konder Comparato na revista Caros Amigos, n. 72, de março de 2003
Para o professor Fábio Konder Comparato, autor em 1985 de um anteprojeto de Constituição encomendado pelo PT, professor titular de direito comercial na USP e especialista em direito constitucional, o aprofundamento da democracia no Brasil depende de uma iluminação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Essa inspiração teria de ser semelhante à que o Mahatma Gandhi teve durante sua luta sem violência para a independência da Índia em relação ao domínio britânico. Então, Gandhi, depois de semanas de caminhada e meditação sobre o próximo passo a dar, chegou ao mar, pegou um punhado de sal, produto que era monopólio estatal britânico em toda a Índia, e proclamou que jamais os indianos pagariam de novo um tributo pelo sal, que passaria a ser de livre comercialização. Isso deu um motivo para as massas indianas se mobilizarem de maneira pacífica. Para Comparato, no cenário político brasileiro, está faltando uma inspiração semelhante do presidente Lula, que faça as massas do país se mobilizarem permanentemente, sem violência, em busca de um projeto concreto. Na sua opinião, por enquanto, “ao contrário daquilo que queremos, que imaginávamos e que ainda esperamos, não há uma modificação substancial da política brasileira, ou seja, o povo não passou a ser um sujeito ativo no cenário político” - esta a fagulha que falta ao governo Lula. Ele acha ainda que é possível processar os torturadores do regime militar, pois seus crimes não prescrevem. Esses processos seriam necessários para estirpar a nódoa do regime militar, que ainda pesa sobre o Brasil, de um modo desconhecido pelas gerações mais jovens, as quais assim se veriam frente a frente com o passado do país.

Nicodemus Pessoa
- Sempre começamos pedindo ao entrevistado para contar um pouco da sua história. Por exemplo, o senhor é um paulista... Sou um pouco mais do que paulista. Sou santista.

Nicodemus Pessoa
- Torcedor do Santos inclusive?

Não. Já me eduquei a não ser torcedor de nenhum time de futebol. Bom, formei-me em direito na USP, depois fiz o doutorado em direito na Universidade de Paris, vim para São Paulo, tornei-me livre-docente da Faculdade de Direito da USP e depois professor titular na cadeira de direito comercial. Ao mesmo tempo, advoguei na área de direito empresarial durante mais de trinta anos. Mas nos últimos anos só me dedicava a dar pareceres e não propriamente a representar clientes em ações judiciais. Acontece que em 1985 o PT me pediu que fizesse um anteprojeto de Constituição. Eu fiz e a partir daí fui aos poucos me voltando mais para o direito constitucional. E então para aquilo que é o cerne do direito constitucional, que é o sistema de direitos humanos. Fui abandonando a advocacia comercial, passei inclusive a dar pareceres de graça para o Ministério Público, e acabei encerrando a minha atividade profissional com um caso que me parece paradigmático, que me deu grande alegria, que foi a propositura de uma ação declaratória em nome de Inês Etiene Romeu, que foi barbaramente torturada em 1971 naquela casa de Petrópolis, ela foi estuprada três vezes e tentou duas vezes o suicídio. Ela não foi feliz na primeira ação, proposta pelo falecido doutor José Aguiar Dias, que foi ministro do Tribunal Federal de Recursos em pleno regime militar. Ela me procurou dizendo que queria unicamente que fosse restabelecida a verdade, porque no prontuário dela no Serviço de Informações constava que tinha sido terrorista e que se dizia presa política, mas ela não tinha sido presa política.

Ricardo Vespucci - Em que ano ela o procurou?

Acho que foi em 2000. Propus essa ação, ela me disse: “Doutor, não quero receber nenhum centavo, o senhor fica proibido de pedir qualquer indenização”. Então pedi apenas que fosse reconhecida a relação de autoria dos atos praticados contra ela, ou seja, cárcere privado, seviciais e estupro pelos agentes da União Federal. E o juiz, em questão de três meses, acaba de dar uma sentença julgando procedente a ação e reconhecendo que foi realmente a União Federal que, por intermédio desses seus agentes, todos do Exército nacional, cometeram esses atos criminosos. Eu disse a Inês: “Olha, vou encerrar a minha atividade profissional com isso para me resgatar de eventuais pecados que tenha cometido durante trinta anos de exercício de advocacia empresarial”.

Nicodemus Pessoa - O senhor disse: “Eu sou mais do que paulista, sou santista”. E me lembrou do Rubem Braga, que falava: “Eu modéstia à parte, sou de Cachoeiro de Itapemirim”. O senhor fala de Santos como se...

Não, é que Santos é a terra do Patriarca, de modo que há uma ligação muito forte com a nacionalidade. O verdadeiro espírito santista é um espírito de brasilidade, sem nenhuma discriminação ou preconceito.

José Arbex Jr.
- Voltando à questão das indenizações, uma das coisas que causaram o racha no movimento das Mães da Praça de Maio foi o fato de parte das Mães aceitarem a indenização do Estado pelos filhos desaparecidos durante a ditadura Argentina. A Hebe de Bonafini disse: “Não aceitamos dinheiro do Estado porque isso seria vender a memória dos nossos filhos e enterrar essa memória em troca de 250.000 dólares”. Como o senhor mencionou esse processo da recusa da indenização, eu queria saber a sua opinião a respeito, porque no Brasil tem-se a percepção de que, quando o Estado paga a indenização, isso é uma vitória.

É uma questão de julgamento pessoal. Pessoalmente, eu não pediria indenização, porque o dinheiro do Estado sai do povo. Isso significaria o povo duplamente prejudicado: fisicamente e moralmente pelas torturas e pelo assassínio e patrimonialmente porque não é o Estado que inventa ou cria esse dinheiro, isso vem de impostos. E a estrutura tributária brasileira é tão injusta, que o pobre paga muito mais do que o rico, de modo que não se pode nem dizer que os ricos, que formam os grandes sustentáculos de um regime criminoso, como foi o regime militar, estariam agora indenizando indiretamente os prejudicados. Mas é uma questão de julgamento pessoal e eu não faria nenhuma restrição àqueles que pedem indenização. No caso de Inês Etiene Romeu, fiquei muito comovido com a posição dela e, como tenho formação cristã, me lembrei - e disse isso ao juiz - de um trecho do Evangelho de São João, quando diz: “Queiram a verdade porque a verdade vos tornará livres”. Ela vivia numa situação de depressão moral porque a verdade sobre o que ela passou não tinha sido exposta com clareza. Acho que a verdade sobre o regime militar deveria ser de algum modo dada como uma espécie de purificação da alma brasileira. Os jovens a quem leciono na Faculdade de Direito não tem a menor idéia do que aconteceu durante o regime militar. E isso é uma mancha, uma nódoa moral que não foi tratada e está infeccionando a alma brasileira. Em primeiro lugar, sob o aspecto jurídico, não temos nenhuma razão para impedir o julgamento desses homens, os que ainda sobrevivem, civis e militares - isso, no sistema de direitos humanos, no âmbito da Organização dos Estados Americanos, é pacífico, não há prescrição, a prescrição é inválida. E, por outro lado, isso é uma espécie de reeducação do povo. É preciso que o povo medite sobre o que aconteceu, sobre como nos comportaríamos hoje se estivéssemos na mesma situação de ontem, porque só aí nós nos tornaremos livres dessa covardia. O general De Gaulle, assim que assumiu o governo provisório, depois da libertação da França, na Segunda Guerra, disse: “A primeira medida é instituir tribunais regulares para julgar os colaboracionistas, porque a França jamais poderá encarar o futuro com simplicidade e com confiança em si se não liquidar essa conta do passado”. Porque ele sabia perfeitamente que muitos dos colaboracionistas, e que até estavam próximos ao governo provisório, tinham escondido essa colaboração, e também sabia muito bem que, pelo menos no começo da ocupação nazista, a maioria absoluta do povo francês apoiava o colaboracionismo.


João de Barros
- Que tipo de resíduo o senhor acha que essa nódoa está deixando na sociedade brasileira?

É o fato de que continua a haver uma certa imunidade, a concepção de imunidade do poder. E continua a haver tanto para isso quanto para outras questões, como, por exemplo, problemas econômicos, a depressão, inflação galopante, a aceitação de que os fins justificam os meios. E isso é desmoralizante, de certa maneira está prejudicando o governo Lula. O professor Boaventura de Souza Santos disse que a eleição de Lula foi uma vitória não da ideologia, e sim da ética. Espero que isso ainda aconteça, mas no momento estamos caminhando para um rumo divergente, e dou dois exemplos que me parecem muito graves. O primeiro é a aceitação do deputado Geddel Vieira Lima como primeiro-secretário da Câmara. É uma função importantíssima, porque é a que distribui todos os benefícios e subsídios aos deputados, de modo que o primeiro-secretário é sempre alguém que forma o seu eleitorado interno.


Nicodemus Pessoa - E esse deputado não tem uma boa biografia, não é?

Bom, segundo o que aparece nos jornais e na televisão sem contestação do próprio, ele é o “Geddel vai às compras”. Mas, de qualquer maneira, a participação dele na corrupção da comissão de Orçamento foi demonstrada na CPI, ele simplesmente no final conseguiu se safar, não se sabe bem como. Mas, ainda que se desse o benefício da dúvida e se dissesse “ele não foi processado nem condenado, portanto não podemos acusá-lo”, um governo ético não pode se permitir a dúvida, ou seja, constituir uma mesa de Câmara com alguém de cuja honestidade se duvida é desastroso. É exatamente aquilo que ocorreu durante o impeachment de Collor. O meu querido tio Evandro Lins e Silva teve ocasião de dizer isso no Senado Federal durante o processo do ex-presidente: “Invoca-se para defender a posição do ex-presidente o benefício da dúvida, mas como se pode admitir como presidente da República alguém de cuja honestidade se duvida? Isto já é uma acusação fatal”. E o segundo fato que me deixa muito perturbado é tratar direitos fundamentais sob a ótica financeira do capitalismo neoliberal. Eu entro nessa matéria super polêmica da previdência social. O governo dos trabalhadores ainda não entendeu que o direito à previdência é um direito fundamental. Portanto, o que se esperava é que o novo governo dissesse: “O serviço da previdência social tem falhas terríveis. A primeira coisa que temos de fazer é repará-las”. Mas ele usou a técnica do guarda-livros: “A previdência social está endividando a nação, então precisamos não consertas as falhas da previdência social, não reconhecer a todos esse direito sagrado, mas simplesmente equilibrar as finanças”. Isso já não é mais pôr o carro adiante dos bois, é pôr o banqueiro e o capital adiante das pessoas humanas. Não é que a gente despreze a questão do equilíbrio financeiro. Não é isso, ao contrário: a previdência social não está equilibrada porque aqueles que deveriam pagar não pagam, ou seja, o sistema contributivo para a previdência social é incompatível com o funcionamento de uma economia que produz cada vez mais desempregados. É ilógico, portanto, tentar fundar o financiamento da previdência social na contribuição dos empregados. Hoje já se reconhece em várias partes do mundo, mas isso nunca é divulgado pela imprensa, que a previdência social do futuro vai ter de se fundar predominantemente na tributação. E são os ricos que têm de pagar mais. Existe ampla base de incidência, como se diz tecnicamente em direito tributário, para fazer essa imposição, quando mais não for - estou entrando num outro capítulo - porque o sistema financeiro tem obtido nos últimos anos uma lucratividade anormal e certamente injusta, para dizer o mínimo. Os jornais têm demonstrado que no ano passado, por exemplo, a lucratividade média do sistema financeiro foi de 24,5 por cento sobre o capital investido, enquanto a do setor industrial foi de 5,6 por cento. A fase financeira do capitalismo atual é muito diferente daquela sobre a qual refletiu Marx. Naquela época, para lucrar, era preciso produzir, não havia outro meio para lucrar senão produzindo, portanto era preciso fabricar e prestar serviços. Hoje descobriu-se a pólvora: é não somente possível, mas muito mais fácil lucrar sem produzir, que é o sistema da especulação financeira, porque, qualquer que seja a lucratividade de uma indústria, os custos são comparativamente muito maiores do que fazer girar uma empresa financeira de tipo especulativo. Esses lucros do sistema financeiro são lucros extraordinários. Já tivemos imposto de renda sobre lucros extraordinários. E não se pode dizer que essa tributação foi feita num regime anticapitalista, num regime socialista. Ora, por que não utilizar esse mecanismo?

José Arbex Jr.
- O professor Celso Furtado declarou que não achava a nomeação de Henrique Meirelles para o Banco Central um dado estrutural do governo Lula, mas um acidente de percurso, porque ele acreditava ou queria acreditar que o Lula, nessa fase do governo, precisava fazer certas concessões para se estabilizar e depois começar a série de reformas que todos esperavam que ele fizesse. O senhor tem essa percepção também ou acha que Henrique Meirelles já é uma sinalização estrutural do governo Lula?

Agora eu volta à sua indagação. Eu gostaria muito que fosse um acidente de percurso, mas tenho muitas dúvidas a esse respeito e, a meu ver, é impossível voltar atrás numa determinada linha de política econômica. Além do que, essa linha é absolutamente contraditória. Todos no Brasil e no exterior reconhecem que o nosso maior problema atual é o endividamento do Estado. Só a dívida pública interna corresponde a 11 por cento do PIB, sendo que, dessa dívida, praticamente a metade, 48,5 por cento, é indexada ao dólar. Foi um crime de lesa-prátia que o governo Fernando Henrique Cardoso cometeu. Infelizmente, esses criminosos não serão julgados por isso. Não havia razão nenhuma para financiar o Estado mediante o lançamento de títulos da dívida pública indexados ao dólar. Ou melhor, não havia necessidade; poderia ter havido uma razão, mas não era uma razão necessitante - o Estado não era obrigado, naquela ocasião, a fazer isso. Isso deu aos bancos não só esses lucros extraordinários - porque, imagine, só nesse setor, se o dólar no ano passado se valorizou cerca de 60 por cento e a taxa básica de juros até novembro foi de 20 por cento, em boa matemática isso dá 80 por cento. Não existe país no mundo em que os bancos, na aplicação em títulos da dívida pública, ganhem 80 por cento. E 80 por cento líquido. E, se o nosso grande problema é o endividamento público, não faz o menor sentido começar o governo aumentando juros; nem tomando a iniciativa de propor ao FMI o aumento do superávit primário. Isso me lembra muito, até para tornar menos grave o que estamos falando, um episódio ocorrido durante o Estado Novo, no Tribunal de Segurança Nacional, de triste memória. Havia um procurador junto ao Tribunal que era uma espécie de acusador público, se chamava Himalaia Virgulino. Os advogados gostavam muito dele pela sua afabilidade, embora fosse um energúmeno. E uma ocasião - isso contado pelo meu querido tio Evandro Lins e Silva, depois vou falar do Evandro, que é importante -, quando os advogados estavam reunidos com esse procurador num ameno bate-papo, ele disse, para espanto geral: “Aqui, todos obedecem ao governo, menos eu. Porque, antes de o governo ordenar, eu já fiz”. Ora, como? Antes de o FMI exigir, eles já aumentaram o superávit primário!


Ricardo Vespucci - Eles deram uma explicação plausível?

Sempre têm explicações. Mas tudo isso tem um denominador comum: ao contrário daquilo que queremos, que imaginávamos e que ainda esperamos, não há uma modificação substancial da política brasileira, ou seja, o povo não passou a ser um sujeito ativo no cenário político. Não se pode mexer com direitos fundamentais, como previdência social, sem pelo menos ouvir o povo. Portanto, se eles querem mudar o sistema previdenciário, muito bem, que votem no Congresso, mas submetam a referendo. A mesma coisa, em matéria de política econômica. A economia não é uma ciência exata, isso é uma lorota que o sistema capitalista desenvolveu. A economia, como a política e o direito, é uma sabedoria de decisões. Os romanos diziam que a política é uma prudência, na tradução da fronesis grega, ou seja, é uma sabedoria de tomar decisões, não se trata de contemplar a realidade, como na astronomia, e dizer que temos vários sistemas no universo. O sentido de teoreia, do grego, é esse, é contemplação. Economia não é isso. Portanto, na economia é preciso saber quais são os objetivos das decisões tomadas. Em outras palavras, a quem favorece determinada política? Não há a menor dúvida de que esse tipo de política iniciado no governo Fernando Henrique Cardoso e que agora está sendo continuado, segundo diz o governo, porque não há outra alternativa, o que é um engano, favorece o sistema financeiro e desfavorece, muito, as camadas mais pobres da população, desfavorece o sistema industrial. Sempre acreditei que os empresários brasileiros fossem inteligentes. Podia duvidar, talvez, da sua justiça e algumas vezes do seu patriotismo, mas sempre imaginei que fossem inteligentes. Tenho de reconhecer o meu erro. A partir do momento em que embarcaram no sistema neoliberal, com privatizações, abertura de fronteiras para a movimentação livre de capitais e desregulamentação da economia, eles se suicidaram. No entanto, eles continuam, protestam retoricamente contra os bancos, mas continuam com a corda no pescoço. Então, resumindo, a política econômica não é uma coisa que esteja ligada à natureza das coisas, não é um direcionamento que o governo toma, porque não há o que fazer contra um fenômeno natural, como a seca do Nordeste, e a prova mais provada de que essa política atual é incompetente, sem falar na injustiça, é o fato de que um bastião do conservadorismo capitalista e neoliberal, como é a revista The Economist, que, em um centro de pesquisas, aliás muito bom, o Economist Inteligence Unit, há questão de duas semanas, fez uma análise da economia brasileira e disse, reconhecendo o óbvio, que o grande problema é o endividamento interno, e que só há uma maneira de começar a lutar contra esse problema: reduzir os juros. E, conclui esse grupo de pesquisas, é claro que isso vai afetar a inflação, mas é muito menos importante isso do que o Brasil, como a Argentina, ser obrigado a quebrar, e negociar em condições de absoluta fraqueza com os credores internacionais. Então, eu gostaria de saber do ministro da Fazenda em que autoridade ele se baseia para dizer que está seguindo uma política correta. Mas continuo a acreditar firmemente no presidente da República. O Lula é um homem de grande sensibilidade humana, um homem reto, em algum momento, e espero que seja breve, ele vai se dar conta disso.


Nicodemus Pessoa
- O senhor já teve oportunidade de comunicar essas divergências diretamente? Já, já.

Diogo Moysés
- E esse continuísmo o senhor enxerga no conjunto do governo?

Não, esse é ate um fator de esperança, evidentemente o governo Lula não é o governo Fernando Henrique. Seria um disparate dizer que é um continuísmo global. O conjunto do ministério Lula é excelente e há ministros de grande valor, personalidades humanas de escol, raramente tivemos na República um ministério tão bom. Agora, é preciso não esquecer uma realidade pungente: tal como está organizado o governo brasileiro, o ministro da Fazenda é um superministro. Se ele quiser, nada acontece aos demais ministérios. É preciso que o presidente saiba disso. Até agora, no entanto, ele tem mantido essa predominância absoluta do ministro da Fazenda. O do Planejamento segue atrás, mas os outros ministros fazem o que podem, e têm feito muita coisa boa. Infelizmente, a imprensa não tem noticiado como deveria. E essa atitude da imprensa é típica da nossa, enfim, é o vício geral do setor no mundo inteiro.


Nicodemus Pessoa - O que merecia ser divulgado e não foi?

As primeiras medidas tomadas, por exemplo, por Marina Silva, por Miguel Rosseto, por Dilma Rousset, não só medidas, mas declarações em que põem o dedo na ferida. Quero aproveitar para divulgar aquilo que, infelizmente, não foi suficientemente divulgado. A AES, que controla a Eletropaulo, quebrou nos Estados Unidos, com uma dívida de 3 bilhões de dólares. Pois bem, a sua subsidiária no Brasil, a Eletropaulo, enviou à matriz, para socorrer a matriz, 1 bilhão de dólares, e ao mesmo tempo deixou de pagar a dívida com o BNDES. Ora, o fato de o governo brasileiro ter financiado empresas estrangeiras para adquirir empresas estatais com dinheiro público, do trabalhador, pois o BNDES gere o Fundo de Amparo ao Trabalhador, o FAT, já foi em si um crime de responsabilidade, que mereceria ser julgado se tivéssemos tribunais competentes para isso. Pois bem, depois disso tudo, essa empresa que embolsou dinheiro do governo, dinheiro que vem do Fundo de Amparo ao Trabalhador, ainda deixa de pagar para remeter 1 bilhão de dólares para a matriz? A Dilma Rousset denunciou isso e mostrou o descalabro dessa política de privatizações. Isso é novo. Agora, essa imprensa que hoje ataca o Lula, sem nenhuma consideração de contexto, nunca atacou a política criminosa de privatizações. É muito fácil dizer: “O Lula antes dizia uma coisa, agora diz o contrário”. “O PT antes votava num sentido e agora vota no outro”. Também acho que isso é uma contradição grave e até muitas vezes antiética, mas aqueles que nunca atacaram os crimes do regime anterior e dos governos anteriores não têm autoridade moral para levantar essas contradições. Mas, quero frisar muito fundamente, em política a gente tem de escolher um lado. Eu escolhi um lado, acho que é o lado certo, o lado do povo dominado. O PT está até agora do lado do povo dominado, portanto, o fato de eu atacar alguns pontos do governo Lula não significa que mudei de lado. Acho que isso é uma contribuição para que o PT e o governo Lula continuem firmemente do lado do povo.


Ricardo Vespucci
- O senhor fala que a não divulgação das boas medidas já tomadas pelo governo Lula reflete um vício da imprensa brasileira e da mundial. Que vício é esse?

É que, na verdade, os grandes órgãos dos meios de comunicação de massa passaram a atuar de acordo com uma lógica típica das grandes organizações. O que interessa é a sobrevivência deles, e o mundo que se dane. Isso existe não só em organizações econômicas, como em organizações políticas e até mesmo em organizações religiosas. Essa sociologia da burocracia egoísta não é de hoje, ela data do começo do século 20. Ostrogorski, Michels mostram como as grandes organizações acabam fechadas dentro de si mesmas e procuram apenas sobreviver. E os grandes órgãos de comunicação de massa entendem que seria muito ruim para eles se fossem considerados órgãos “chapa branca”, ou seja, subsidiários do governo. Acontece que, muitas vezes, esses mesmos grandes órgãos de imprensa ou grandes redes de televisão que procuram sobreviver contra tudo e contra todos e, portanto, não têm nenhuma ética, a não ser a do egoísmo e da auto-sobrevivência, acabam achando que, em determinadas situações, para sobreviver, é preciso, sim, defender o governo contra todas as evidências, como é o caso agora dos grandes órgãos de comunicação nos Estados Unidos. Nessa última manifestação mundial contra a guerra no Iraque, que, segundo as estimativas mais conservadoras, reuniu 5 milhões de pessoas nas ruas, em sessenta países, em seiscentas cidades do mundo inteiro, na televisão norte-americana havia poucos flashes, e logo depois apareciam os acadêmicos de plantão, pessoas evidentemente, como se sabe, “muito imparciais”, “nenhum vínculo” com o governo e “nem defendem ideologias”, para explicar que o que está acontecendo não é propriamente uma manifestação popular, mas uma manipulação de grupos bem conhecidos etc. Tenho procurado refletir muito sobre os meios de comunicação de massa, que têm um papel político decisivo, porque vivemos agora numa sociedade de massas, quer dizer, não há mais a comunicação face a face, somos privilegiados aqui porque estamos numa roda, estamos trocando idéias. Mas isso não terá a menor repercussão política, o menor efeito social se não for publicado. Daí porque, a meu ver, as constituições do futuro vão ter de tratar do setor de comunicação de massas necessariamente como órgão de poder, não oficial, mas como órgão de poder. Não se pode disciplinar as empresas de comunicação de massas como empresas iguais às outras. Não vamos confundir liberdade de imprensa com liberdade de empresa. São empresas diferentes, porque trabalham num setor de grande interesse público e, quando falo interesse público, é interesse do povo, publicus em latim significa “do povo”. Não é interesse do Estado, é interesse do povo. Não podemos mais nos comunicar a não ser por intermédio dos meios de comunicação de massa, salvo por meio da Internet, e essa é uma das coisas mais extraordinária dos últimos tempos. Essa última manifestação que reuniu pelo menos 5 milhões de pessoas nas ruas do mundo inteiro foi possível em pouco tempo por causa da Internet, precisa ser agora explorada ao máximo. Por exemplo, o Acordo Multilateral de Investimentos, que foi negociado no âmbito da OCDE, a organização internacional que reúne os países supostamente mais industrializados do planeta, estava em preparação, o projeto já estava avançado e dava aos capitais estrangeiros muito mais proteção do que aos imigrantes. Os imigrantes podem ser presos e deportados sem maiores dificuldades, enquanto que, pelo projeto do Acordo Multilateral de Investimentos, os capitais estrangeiros gozavam de proteção absoluta, a tal ponto que os titulares do capital estrangeiro podiam recusar a jurisdição dos tribunais locais e exigir que o eventual conflito fosse julgado fora do país. Pois isso foi denunciado publicamente porque vazou pela Internet e aí o projeto abortou. Não se pode convocar 5 milhões de pessoas, em dois ou três dias, para se manifestar nas ruas a não ser pela Internet. Qual é o órgão de imprensa que vai fazer isso hoje?

Renato Pompeu
- Li um artigo seu em que o senhor fala que é necessário aumentar os poderes executivos, legislativos e judiciários da ONU. O senhor pensa em algo como um governo mundial?

Eu penso e advogo ardentemente uma organização mundial. É esse o futuro. Hoje estamos assistindo a uma coisa maravilhosa que é o surgimento dos povos no cenário internacional como sujeitos ativos. Por que os Estados Unidos até hoje não conseguiram desencadear a guerra no Iraque? Porque estão perdendo a guerra de propaganda. Os povos já não aceitam mais essas explicações dadas sumariamente depois do 11 de setembro de 2001, de que tudo é culpa dos terroristas. E, veja, os dois países onde os povos se opõem mais veementemente à guerra no Iraque são, na Europa, a Espanha e o Reino Unido, países cujos Estados apóiam sem restrições o governo norte-americano. Aí temos essa realidade extraordinária, os povos contra os governos. É preciso, portanto, desmontar essa arquitetura dos Estados no cenário internacional e estabelecer a verdadeira democratização que põe os povos em linha de frente. Escrevi recentemente que teríamos de pensar seriamente no quadro da reforma das Nações Unidas, numa mudança do critério de voto na Assembléia Geral, porque, na Assembléia Geral, cada Estado tem um voto. Mas isso significa reforçar abusivamente os Estados em detrimento dos povos, é preciso compensar com o peso das populações. Então as Ilhas Seichelles têm o mesmo peso de voto que a China? Isso não faz sentido na lógica democrática. E, mais, se a Carta das Nações Unidas, como diz o preâmbulo, quer favorecer a difusão dos direitos humanos e a defesa da dignidade humana no mundo todo, os membros das Nações Unidas têm de ter o mínimo padrão democrático. Portanto, não é possível admitir que votem na Assembléia Geral, por exemplo, lado a lado, países de governos autenticamente democráticos e ditaduras. Esses países que deixam o sistema democrático deveriam ter o direito de voto suspenso na Assembléia Geral das Nações Unidas.

João de Barros
- como o senhor mensuraria essa democracia, seria apenas o ato de votar?

Não. A equação democrática é soberania popular mais respeito integral aos direitos humanos. Podemos discutir o grau da soberania popular. Eu, para início de conversa, aceitaria o critério atual de que, se o povo não participa diretamente das grandes decisões, pelo menos ele tem o direito inafastável de eleger os governantes. Agora, a idéia democrática, que é fecunda, praticamente inexaurível, vai se ampliando no sentido da democracia participativa, e aí volto ao caso brasileiro - não podemos admitir que o governo dos trabalhadores faça restrições ao avanço da democracia participativa, é preciso insistir, a tempo e a contratempo, que todas as grandes decisões que afetam o futuro do país só serão legítimas quando referendadas pelo povo e a meu ver, no caso da ALCA, por exemplo. Já disse isso, já escrevi que o projeto da ALCA tal como foi apresentado pelos Estados Unidos é incompatível com a nossa Constituição, mas, se o governo insistir em negociar a ALCA e chegar a um acordo final, isso seria ilegítimo se aplicado no Brasil sem o referendo popular.


Ricardo Vespucci
- quantas medidas, hoje, seriam objeto de referendo?

Por exemplo, a modificação do sistema de previdência social, e aí abre-se um grande espaço para a reivindicação popular - o orçamento participativo não pode tardar no plano federal. Deve-se cogitar de uma modificação da Constituição, sempre com o referendo popular para introduzir o orçamento participativo obrigatoriamente nos três níveis da Federação. E, falando em modificação de Constituição, gostaria de dizer mais uma vez do meu desalento, da minha indignação pelo fato de essa Constituição de 1988, que não foi referendada pelo povo, ter sido remendada 44 vezes sem que o povo não apenas não se manifestasse, mas nem sequer soubesse que ela estava sendo modificada. Isso os meios de comunicação de massa que hoje são tão críticos do governo do PT jamais criticaram, eles acharam isso perfeitamente normal.


Ricardo Vespucci
- Como é que se dá o referendo de uma legislação trabalhista, por exemplo, cheia de artigos e alíneas?

Tudo depende da boa técnica do referendo. Ele só pode comportar uma alternativa, sim ou não, porque a técnica do debate e da discussão é do parlamento, mas o mais recomendável é que o povo decida sobre princípios e, no fundo, é esse o espírito do orçamento participativo, o povo não vai discutir verba por verba, mas vai aprovar as diretrizes orçamentárias. Temos agora, pela Constituição, a distinção entre a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a própria Lei de Meios, que é o orçamento, o orçamento tem de obedecer as diretrizes orçamentárias que foram votadas pelo congresso nacional. É justamente sobre isso que o povo não só pode, mas deve se pronunciar. É um preconceito muito da nossa classe achar que o povo não entende do assunto e não tem como votar. Em primeiro lugar, o povo sabe muito mais do que a gente imagina, em segundo lugar a técnica de discussão pública é pedagógica, o povo se interessa e acaba aprendendo rapidamente e, ao final das contas, como diziam os grandes pensadores da Grécia antiga: “O governante é um educador e a função da política é educar o povo”.


José Arbex Jr. - Voltando à ALCA. Como se explica a completa cegueira da elite industrial brasileira para o que ela vai significar do ponto de vista do sucateamento do parque industrial, como entender a passividade, ou conivência ou mesmo cumplicidade, como é o caso desse empresário da Sadia que agora é ministro de governo, Furlan, e é um advogado sincero da ALCA?

João de Barros
- Só emendando, o senhor também acha que o capital nacional é mais bem-vindo do que o internacional? Haveria diferença entre ambos? São duas questões importantes.

No caso do ministro Furlan eu entendo, porque ele vem de um setor empresarial que depende muito de exportação e tem tido uma atividade cheia de êxitos até agora, de modo que ele vê a questão sob a ótica do seu setor industrial e acha que pode tirar benefícios da ALCA. Mas acho que é uma visão muito estreita da realidade. Agora, quanto aos industriais dos outros setores, eu realmente não entendo e estou procurando alguém que explique por que razão os industriais brasileiros têm aparentemente uma vocação ao suicídio. Agora, a segunda questão, que é da maior importância. O governo Fernando Henrique Cardoso, seguindo a linha do governo celerado de Fernando Collor de Melo, provocou uma vasta desnacionalização da economia brasileira. Os dados estão aí para a consideração de todos. Atualmente, 56 por cento do faturamento industrial é feito por empresas estrangeiras. Dos vinte maiores bancos que operam no Brasil, onze são estrangeiros. Ora, isso é absolutamente antidemocrático e representa um obstáculo seríssimo a uma política econômica autônoma. Por que é antidemocrático? Porque a democracia é um regime em que todas as pessoas, todas as organizações, todos os agentes têm de respeitar os direitos e deveres comuns daqueles que vivem no território brasileiro, ou seja, não existem apenas pessoas cidadãs, a empresa que opera no Brasil também deve ser uma empresa cidadã, deve sobrepor o interesse nacional ao interesse próprio empresarial. Mas nunca se pode exigir de uma empresa estrangeira que ela seja uma empresa cidadã. No conflito entre o Brasil e potências estrangeiras, sejam elas Estados, organizações internacionais como o FMI, não se vai exigir da empresa estrangeira que esteja do lado brasileiro, isso até a Velhinha de Taubaté entende. Ora, o que significa isso em termos práticos? Significa que o governo brasileiro perdeu instrumentos de direção da economia. Mais: politicamente, as classes dominantes já não são mais predominantemente brasileiras, vimos isso nas últimas eleições, uma vasta movimentação no setor das empresas estrangeiras, porque se temia que o Lula fosse o demônio. Mas aí me desculpem, quero fazer uma imediata ligação com o problema Lula, que me preocupa muitíssimo. Quero mais uma vez reafirmar a minha grande confiança e a minha admiração irrestrita por ele. Acho que ele tem uma rara inteligência política. Costumo dizer que faço sempre o teste quando ele é entrevistado pessoalmente - procuro responder antes as perguntas feitas a ele e ele sempre responde melhor do que eu responderia. Não que eu seja um portento, mas pelo menos isso já me dá uma dimensão da minha modéstia de professor diante desse homem que não tem nenhum título universitário. Ele é uma grande inteligência política. Também é uma pessoa de grande sensibilidade. A política não é uma atividade racional, é uma atividade integralmente humana e o ser humano é, sobretudo, um animal sentimental. Na filosofia dos valores se reconhece que o justo ou o injusto, o decente ou o indecente, o belo ou o feio não são apreendidos só pela inteligência, são apreendidos pelos sentimentos, e o Lula tem essa capacidade. Pois bem, como se explica então que o que esteja acontecendo agora seja uma aparente não digo submissão, longe disso, mas enfim uma concordância do governo Lula com a predominância do setor financeiro na economia brasileira? Quero dar uma explicação que talvez não seja a verdadeira - acho que isso vem da experiência sindical do Lula. Quando ele se tornou grande líder sindical, estávamos no regime militar e, no regime militar, todas as partes em conflito no setor econômico, empresários, trabalhadores e até os consumidores sabiam que não podiam pedir a intervenção do governo, não tinham confiança no governo, e o Lula teve os seus maiores sucessos sindicais negociando diretamente com os empresários, sem apelar para a intervenção governamental. Aliás, quando o Estado interveio, foi para colocá-lo na cadeia, como todo mundo sabe. Então, a partir daí, a minha explicação: ele criou uma imagem da sociedade em que os grandes conflitos são resolvidos nas mesas de negociações, o que a meu ver é uma imagem generosa mas profundamente falsa. No campo político e econômico há uma fase em que o conflito, para ser resolvido, exige a intervenção de um poder superior, porque as partes sozinhas não conseguem pôr fim ao conflito e essa é a função do Estado, em nome do povo. Ora, no caso dos bancos, talvez eu esteja dizendo bobagens, não sou especialista na matéria, mas já trabalhei muito em banco, e alguma coisa acho que conheço. Veja o que aconteceu quando o Lula chamou os banqueiros a Brasília. A pessoa que assistiu à entrevista me contou e foi fascinante. O Lula, é tipicamente dele, disse aos banqueiros: “Os senhores vejam, uma pobre dona de casa tem de comprar uma geladeira, a geladeira que ela tinha pifou e não tem dinheiro pra comprar à vista, e faz um carnê de pagamento e tem que pagar esses juros de 100 por cento ao ano, os senhores vejam como isso é terrível”. Então, essa pessoa que assistiu à entrevista me contou que os banqueiros todos ali sentadinhos em frente ao Lula, todos engravatados e tomando notas! E depois a conclusão deles: “Não, nós vamos estudar para ver se há uma solução”. Ora, nos governos anteriores, militares ou civis, nunca perguntaram aos banqueiros como se resolve o assunto. Eles, por exemplo, aumentavam o depósito compulsório e diziam: “Se vocês quiserem aproveitar esse dinheiro que recolhemos, vão ter de emprestar ao consumidor, para compra de equipamentos agrícolas, vão ter de emprestar para capital de giro de pequenas e médias empresas com o juro que nós fixarmos, se vocês não se interessarem, o dinheiro fica conosco”. A questão dos títulos indexados ao dólar: os bancos têm mais ou menos a metade do estoque dos títulos da dívida pública indexado ao dólar, é por isso que, nas vésperas do vencimento, eles fazem movimentações fictícias com a moeda norte-americana e elevam a cotação, porque a cotação do dólar no vencimento é calculada pela cotação dos três últimos dias em que houve negociação. A outra metade está nos fundos de investimento que os bancos administram. O governo não precisa criar uma comoção nacional, não precisa tomar nenhuma medida revolucionária, não precisa ir ao Congresso, ele simplesmente chama os bancos e diz: “Vejam, consta, pelos nossos registros, que vocês têm cerca de metade do estoque de títulos indexados ao dólar. Então, quando chegar o vencimento desses títulos que são de sua carteira própria, não os outros que são de carteiras por vocês administradas, quando chegar o vencimento, vocês vão trocar por outros títulos que vamos emitir sem indexação ao dólar”. Obviamente, os banqueiros vão protestar, alegar direitos adquiridos, e o governo dirá tranqüilamente a eles: “Bom, é sua opção, a partir do vencimento desses títulos, vocês serão descredenciados como dealers no lançamento de títulos públicos do governo brasileiro, muito obrigado e até mais ver”.


José Arbex Jr.
- Conversando com lideranças legítimas e expressivas dos movimentos sociais - não vou citar nomes porque não fui autorizado -, há um certo consenso de que o senhor seria um nome ideal a ser lançado como presidente da República?

Mas isso é uma piada de mau gosto.

José Arbex Jr.
- Se um dia toca o telefone e do outro lado da linha está o Luiz Inácio Lula da Silva e fala “professor, queria convidá-lo para compor o ministério”, qual seria a sua resposta?

Tenho muita dificuldade em aceitar, seria preciso saber em que ministério... mas em princípio eu não aceitaria.


José Arbex Jr. - Por quê?

Porque cada pessoa tem o seu projeto de vida, eu já entrei na fase não digo a do “Jesus está chamando”, mas já estou me aproximando dos 70 anos, tenho 66 anos e o meu projeto de vida é ensinar e divulgar certas idéias.


Renato Pompeu
- Mas o senhor mesmo não disse que o político deve ser um educador?

É verdade, agora um ministério... notem bem, coisa que no geral se desconhece, a palavra ministro vem de minus, quer dizer que ele é o menor, eu só aceitaria se tivesse uma posição de total e completo acordo com a política geral do presidente da República e me reconhecesse competente em alguma matéria, o que eu acho difícil.

Diogo Moysés
- É possível fazer uma avaliação do seu colega Márcio Thomaz Bastos e do que vem acontecendo no ministério?

Ele justamente faz parte desse grupo excelente de ministros que o Lula nomeou e acho que já está fazendo muito e vai fazer ainda muito mais. Há um setor muito delicado no ministério, que é a Polícia Federal, e eu espero que ele saiba equacionar esse problema. A proposta de mudança do Judiciário é válida, importante, mas eu gostaria de poder meter a minha colher de pau nessa questão. Li hoje no jornal e ouvi ontem na rádio que um funcionário do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) fez pesquisa sobre o funcionamento do Judiciário e dizia que o funcionamento eficiente da Justiça é aquele em que os juízes não resolvem, não decidem violar a lei para proteger os direitos sociais. Parece que ele é economista, eu diria que é de tomar muito cuidado da parte dele fazer como estou fazendo agora, metendo a minha colher de pau em outros assuntos que não são da minha área, mas reconheço que ele disse uma bobagem. A lei está submetida à Constituição e a de 1988 é organizada em torno de princípios, e esses princípios começam pela proteção da dignidade humana, no artigo 3º, numa espécie de carta de princípios que tem até quase um sabor religioso, ela diz assim: “São objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil construir uma sociedade justa, livre e solidária, garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a miséria e a marginalização e reduzir as desigualdades setoriais e regionais,promover o bem de todos, sem preconceitos de raça, classe, religião...” etc. Depois tem um capítulo sobre direitos humanos. Ora, quando o juiz verifica que uma lei, na sua aplicação prática, contraria esses princípios, não é que ele pode deixar de aplicar a lei, ele é obrigado, em consciência, a deixar de aplicar a lei. Mas o fundamental na reforma do Judiciário está em garantir a independência da magistratura, a independência do Judiciário diante do Poder Executivo. Tradicionalmente, o Judiciário sempre foi submetido à influência determinante do Poder Executivo, e é o que ocorre com o maior tribunal do país, que é o Supremo Tribunal Federal. Infelizmente, depois que o Lula foi eleito, não pude me comunicar com ele, essa é a maldição do poder, o sujeito fica fechado, se aliena do povo, mas mandei o recado - entendo que o presidente da República não tem legitimidade mais para nomear discricionariamente ministros do Supremo Tribunal Federal. É sabido que os ministros nomeados por um presidente são considerados “a bancada do presidente”. O Lula tomaria uma medida de grande relevância política e de grande repercussão nacional e sobretudo falaria muito a esse inconsciente dos setores jurídicos do país, se declarasse: “Eu não me acho legitimado a nomear quem eu quiser para o Supremo Tribunal Federal sem ouvir a sociedade e os seus órgãos representativos, o Judiciário, o Ministério Público, a Ordem dos Advogados do Brasil” etc.


Diogo Moysés
- E ele é que criaria esse novo mecanismo?

Ele não precisaria mudar a Constituição, mas já iniciaria a mudança da Constituição, e esses ministros que ele nomeasse teriam uma autoridade moral extraordinária, porque ninguém diria: “Esses são ministros do presidente”. Vejam. O Poder Judiciário - Montesquieu disse isso muito bem - é o único que não tem poder, parece uma contradição, mas ele queria dizer o seguinte: é o único que não dispõe de recursos para impor as suas decisões, é obrigado a pedir o auxílio do Executivo para isso, mas é aquele que, por isso mesmo, mais depende de autoridade moral, de respeito do cidadão. O Judiciário começa a declinar a partir do momento em que o povo já não acredita mais na idoneidade, na independência do juiz. Então, esse é o grande problema, em relação ao Executivo, mas há também a independência dos magistrados. Os magistrados de primeira instância são subordinados aos tribunais superiores. Os tribunais superiores. Os tribunais superiores e, no caso do Ministério Público, os conselhos superiores do Ministério Público, se acham patrões do juiz de primeira instância e dos promotores de justiça. É muito difícil entender isso, até mesmo os formados em direito não entendem. Aí falta essa educação cívica. O juiz de direito e o representante do Ministério Público não estão submetidos a uma hierarquia funcional, como no Executivo. No Executivo, o chefe de seção tem direito disciplinar sobre o seu subordinado e pode puni-lo e dar ordens, e o subordinado é obrigado a cumprir as ordens, desde que não sejam ilegais. O desembargador que der ordem a um juiz para ele decidir neste ou naquele sentido comete um crime de prevaricação.


Ricardo Vespucci - E é isso que vive acontecendo?

Não diria ser a regra geral, mas acontece amiúde, a todo momento topamos com isso. Essa seria realmente uma medida que sacudiria o Poder Judiciário. E quero terminar, porque já falei enormemente, dizendo o seguinte:política é também uma representação simbólica. Não se trata apenas de tomar medidas que tenham efeito concreto, material. Trata-se também - como disse o Mahatma Gandhi - de falar às mentes e aos corações.


José Arbex Jr.
- Mas a bancada do PT está tomando o caminho inverso, porque, nessa lei que dá foro privilegiado a ex-funcionários do governo, o PT votou junto com o PSDB e com...

Pois é você me tirou as palavras da boca. O que está faltando é que o presidente da República, que tem autoridade moral para isso, faça - como disse o Luis Fernando Veríssimo em uma crônica maravilhosa - um gesto, nem que seja um gesto só, para que o povo entenda que ele está do seu lado, não do lado dos banqueiros. E o Veríssimo, nessa crônica maravilhosa, lembrou o famoso ato político de Gandhi que deu início ao processo de independência da Índia. O governo britânico tinha o monopólio do sal, só se podia comprar sal do governo, e embutido no preço havia uma espécie de tributo. Isso afetava sobretudo as classes pobres, a imensa maioria da população indiana. Em 1930, quando todos pressionavam Gandhi para iniciar o processo de revolta contra o governo britânico e ele hesitava porque sabia que os indianos iriam iniciar um processo de revolução armada, violenta, ele passou um mês meditando e dizia aos amigos: “Ainda não encontrei a verdadeira solução”. No fim de um mês, ele chamou vinte jovens - estavam a mais de 3.500 quilômetros do litoral - e disse: “Vamos iniciar uma caminhada muito simples para mim”, dizia ele, já velho, “é tão fácil, vamos andar 18 quilômetros por dia”. Brincadeira de criança, mas havia por trás disso um enorme projeto político. Ele atravessou centenas de aldeias. Em cada aldeia era recebido com flores, à maneira indiana, e dizia: “A Índia precisa se libertar do jugo britânico, precisa se tornar independente, mas no respeito integral às pessoas, aos ingleses” etc. Em cada vilarejo ele dizia isso. Quando chegou depois de mais de um mês à beira-mar, havia centenas de fotógrafos e jornalistas ali esperando um gesto dele. Ele se abaixou e recolheu um pouco de sal, era uma zona salina, e disse (infelizmente, naquela época não existia televisão): “Peço a todos os indianos que doravante não respeitem mais o monopólio do sal”. A Índia pegou fogo. É um gesto de genialidade política! Eu acho que Lula tem capacidade para gestos desse tipo. É a minha esperança e acho que ela não vai morrer.


João de Barros - O senhor teme que ele possa ser enredado também pela situação, quer dizer, o povo ganhou na urna mas perdeu no tapetão?

É esse o perigo. Não por malícia do governo. Acho, por exemplo, que o Palocci é um homem de boa-fé. Ele acredita em uma política que, a meu ver, vai tornar cada vez mais difícil a solução do nosso problema. Mas eles vão ficar enredados por essa maldição do poder. Porque estão cercados de pessoas que a todo momento dizem: “Olha, cuidado, isso vai acabar mal...” “Todos os governos de esquerda foram para o brejo!” “Cuidado com a inflação”. O que é de uma desonestidade intelectual formidável da parte desses teóricos do capitalismo. Ainda o Luiz Gonzaga Belluzzo lembrava, em um artigo que escreveu na Carta Capital: “Um dos grandes fatores de recrudescimento da inflação, nos últimos anos, foi justamente a privatização”. Porque o Estado controlava os preços das empresas estatais. E em setores de infra-estrutura, telecomunicações, transportes, energia. A partir do momento em que isso passou para a empresa privada, a empresa privada disse: “Olha, não sou instituição de benemerência. Não sou mais órgão público. Eu quero é ganhar dinheiro”. Então, esse problema de inflação é apenas um biombo para esconder o verdadeiro interesse, que é a manutenção dessa hegemonia do setor financeiro sobre a economia. Se eles não afundarem, eles vão afundar o país. Mas no mundo todo a perspectiva é sombria, o capitalismo financeiro está caminhando para a sua própria destruição.

José Arbex Jr.
- Do ponto de vista da relação do capitalismo financeiro no resto do planeta, estamos assistindo à exacerbação absurda do poder das corporações, parte também das corporações financeiras e a arrogância do governo Bush, que outro dia disse que a Alemanha faz parte do mesmo time que o Irã, Coréia do Norte e todos os países que não querem punir o Iraque. Quer dizer, está comprando pau até mesmo com as potências européias do G-7. a partir daí é fácil avaliar a brutalidade cada vez maior com que vai tratar o Brasil, para eles o quintal do mundo. Podemos esperar uma ofensiva imperialista maior do que já houve até hoje. O atual governo estaria preparado para enfrentar essa pressão?

Eu não formulei a pergunta dessa maneira ao Lula logo depois da eleição, mas assinalei a ele esse problema, que é um dos mais sérios que o Brasil vai enfrentar. Curiosamente, o Lula não achou que fosse de grande seriedade. E eu retrospectivamente interpreto isso dando a essa reação do Lula a mesma explicação que dei há pouco. Ele está sinceramente convencido de que, negociando honestamente, abertamente com o governo americano, ele acaba encontrando uma solução. Felizmente, o Ministério das Relações Exteriores está sendo dirigido por diplomata de altíssima competência, e o Lula é assessorado por outra pessoa de grande competência e grande valor moral, o Marco Aurélio Garcia. O desempenho do Ministério das Relações Exteriores é excelente nesse início de governo. O que quero assinalar é o fato de que esse conflito com os norte-americanos não se resolve mediante negociação; como o conflito com o setor financeiro não vai se resolver mediante negociação. Acontece que é mais fácil resolver o problema com o setor financeiro dentro do Brasil. Porque o governo manda, e não pode deixar de mandar. No plano internacional é muito mais difícil porque não temos como nos opor aos Estados Unidos, mas temos como criar obstáculos para atrasar cada vez mais a implantação do projeto norte-americano de dominação da América Latina. Por exemplo, no caso da ALCA, é mais do que evidente que o governo norte-americano não vai poder impedir que o governo brasileiro submeta a referendo um futuro acordo. Ele não precisa dizer que não aceita o acordo. Ele pode dizer: “Olha, o povo votou, e votou contra”. O referendo está previsto na Constituição. Não há nenhuma proibição de que isso se estenda também a acordos internacionais. Mas, sobretudo, tenho muita esperança de que essa diplomacia brasileira vai tecer vínculos com outros países, chamados países-baleias, que poderão formar com o Brasil um bloco de oposição a essa prepotência dos Estados Unidos, e da União Européia também, no foro internacional, por exemplo, na OMC. Já tivemos o apoio da Índia no caso da quebra de patentes de medicamentos na OMC. É preciso costurar isso. A China ficará certamente ao lado do Brasil em alguns campos. Isso é o que se espera.


Natalia Viana
- O senhor acha que essa resistência à política dos EUA vem dos movimentos sociais, da população?

Infelizmente, o povo ainda não foi, sobretudo no Brasil, suficientemente instruído sobre esses perigos. No caso da guerra ao Iraque, consideramos isso muito distante e durante muito tempo - e aí volta a criticar os meios de comunicação de massa - eles não alertaram o público leitor e os espectadores de televisão para o fato de uma guerra no Iraque trazer conseqüências imediatas no plano econômico para o Brasil. A mesma coisa com a guerra do Afeganistão. Quero salientar que um jornalista da Globo escreveu um livro muito interessante sobre o Afeganistão mostrando a cumplicidade vergonhosa dos grandes órgãos de comunicação de massa, na apenas nos Estados Unidos, mas também no Brasil.

José Arbex Jr. - “Deus é inocente, a imprensa não”.

É, Carlos Dornelles. É por isso que, por exemplo, nessas manifestações de rua contra a guerra do Iraque, o Brasil não brilhou muito, tivemos poucas manifestações.


Nicodemus Pessoa - Professor, queria incluir um pouco da memória da sua atuação política nos anos da ditadura. Poderia falar disso?

Olha, eu fiz muito pouco, e me reprovo muito por essa omissão. A única coisa que fiz, que tem um certo valor, foi ter atuado na Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, sob a orientação do dom Paulo Evaristo Arns. Na época éramos um dos poucos elos de comunicação com o governo, por intermédio de dom Paulo, e tínhamos contado direto com toda aquela tragédia. As pessoas vinham à Comissão Justiça e Paz contar não só aquilo que tinha acontecido a seus familiares e amigos, mas aquilo que eles pessoalmente tinham sofrido. E procurávamos divulgar essas informações, procurei divulgar essas informações na Europa, porque nenhum governo, mesmo o mais ditatorial, pode permanecer, pode funcionar apenas com base na força. Ele precisa sempre de uma base de legitimação moral. É essa a homenagem que o vício presta à virtude. Acho que dei uma pequena contribuição aí, mas não foi relevante. Quero aproveitar para manifestar minha admiração por todos aqueles que sofreram nas mãos dos verdugos do regime militar, e foram jovens, moços e moças como eu, e que tiveram a coragem que não tive de me levantar contra o regime. Mas, como eu estava dizendo, já falei muito e queria terminar lembrando o ministro Evandro Lins e Silva, que foi uma figura notável porque defendeu perante o Tribunal de Segurança Nacional, sem receber um centavo de honorários, mais de um milhar de presos de todo o espectro político, da extrema esquerda à extrema direita, e ao terminar seu livro de memórias, que é de grande relevância e interesse - O Salão dos Passos Perdidos - , ele lembrou aquele episódio que ocorreu no Nordeste, sua pátria. Havia lá um certo costume, quando o filho do coronel se formava, e geralmente se formava em direito, o coronel convidava todos os amigos e parentes para uma sessão solene no teatro da cidade onde o jovem diplomado ia fazer um discurso. Então, em uma dessas ocasiões, o coronel foi e estava com seu dileto amigo ao lado e muito emocionado, que ouviu o filho falar, e quando terminou o coronel se virou para o amigo e perguntou: “Que tal? Como foi meu menino?” E o amigo: “Muito bem, ele fala muito bem. O problema é que o assunto terminou e ele continua a falar”.


Ricardo Vespucci - Eu queria ouvi-lo sobre a sua relação com os alunos. Considero uma parte fundamental.

Mas isso quem pode me dizer é você, que foi meu aluno! O que você vai me dizer é o que vai me envergonhar! Durante muitos anos fui tido como um professor cruel. Um professor que não admitia a menor falta. Mas foi pecado de juventude. Quando meus filhos cresceram e felizmente tiveram uma relação muito franca comigo, o que é muito bom para os pais, porque a gente aprende a se enxergar, passei a ver em todos aqueles moços e moças na minha frente outros tantos filhos e filhas, e fiquei muito mais descontraído. Hoje, o grande prazer meu é lecionar. Por isso eu dizia que não quero assumir nenhum caro público, não só sem falsa modéstia, porque acho que não sou competente e porque tenho certos vícios de temperamento, sou siciliano, tenho estopim curto e certamente vou brigar no dia seguinte, mas também porque isso vai me afastar dos meus alunos.

Ricardo Vespucci - Quantos filhos o senhor tem?

Tenho três, mas tenho sobretudo uma neta. E essa neta é a doçura do meu crepúsculo.